segunda-feira, 6 de julho de 2009

'Ser ou não ser, essa é a questão' disse um Hamlet brasileiro


O poder que esse texto exerce sobre uma platéia não é segredo desde 1600. Hamlet é a mais longa peça de Shakespeare e o que poderia assustar os leitores, se torna o elemento de conquista, a densidade do texto é dominadora. Seria impossível contabilizar quantas vezes Hamlet foi encenado e cair na obviedade de uma peça tão famosa é um risco.


Risco que o diretor Aderbal Freire Filho não cometeu, a montagem traz uma tradução fiel ao texto original, mas não esbarra no coloquialismo nem no erudito, caminha por uma linguagem clara e compreensiva.


A atmosfera cênica remete a um ensaio de teatro. A iluminação ampara essa intenção, toda parafernália está ali, bem a mostra. Assim como os atores que participam do jogo como elemento teatral. Hamlet/Wagner Moura parece tocar no exagero em alguns momentos, mais a proposta é visível e dá o tom a personagem. Gestos largos e enfáticos casam com a respiração que parece querer passar toda a inquietude da alma de Hamlet.

Percebe-se a liberdade dos atores em ação, eles circulam pelo palco, são contra-regras, atores em exercício, carregam um ou mais personagens, em alguns momentos ao se sentarem nas escadas laterais (composição cenográfica) se tornam platéia. Caio Junqueira/Horácio atua com propriedade e cresce tanto no decorrer da peça que na cena final, ao tomar Hamlet em seus braços é possível desejar uma continuidade protagonizada por Horácio. Tonico Pereira, o tio traidor, somente confirma sua autoridade cênica e nos mostra que o palco merece ser sua morada constante. O humor dramático ganhou peso nas cenas de Claudio Mendes, o manejo que ele faz é peculiar e preciso.


Um time forte de atores, que parece ter acertado mais do que cometido erros. Carla Ribas, Georgiana Góes, Fábio Lago, Marcelo Flores e Felipe Khoury, imprimem suas atuações na casa da normalidade e isso não afeta a peça, estimula.


O contemporâneo contribui na montagem do clássico, os figurinos de Marcelo Pies em tons neutros caracterizam a proposta, e a idéia do uso dos casacos parece colaborar com a investida do ator para encarnar a personagem, além de demonstrar o estabelecido pelo avesso. A filmagem feita ao vivo e reproduzida no telão ao fundo do palco aguça o público, a câmera é ligada para demonstrar a dramaticidade, e esses momentos a olhos nus parecem tão oportunos.

No enredo onde a loucura real e a loucura fingida traçam um paralelo, a loucura artística foi quem saiu com o maior ganho.


Juliana Albuquerque

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